quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Uma bolha só nossa


Levo uma vida de ti. Sinto-me a escorregar do fragmento da vivência que somos. Há mais perguntas que respostas e a neblina posta a nu pelos candeeiros da rua não é a única dúvida no ar. Dou-me de mim mais do que aprendi a dar e mesmo isso sinto não ser suficiente. Caminho contigo passeios batidos em cores de inverno, olhando não para o amanhã, recusando a hora seguinte, antecipando despedida. Aí ver-me-ás derrotado perante as pedras que montaram a nossa existência, ver-me-ás vergado perante a conivência do destino perante a nossa luta para o contrariar. Se o tempo é imparcial e a espaços apenas mais uma bolha em que existimos isolados em quartos escuros e janelas espelhadas ao conhecimento de estranhos então é de cruel existência. 

Por agora sinto que a pergunta não é se, mas quando. Não quero pensar nisso. Não quero ver o avião descolar. Cada conversa do amanhã é mais uma faca. Vejo ossos de edifícios e pergunto-me como se aguenta a estrutura, penso como isso se aplica a nós e fujo. É muito difícil explicar nas longas horas da noite em que o Sol ameaça espreitar, horas em que o sono luta por me conquistar, como existimos e onde vai a nossa sinergia acabar. Então desligo. Não tenho de explicar se apenas apreciar existir. Mas vendo essa existência como frágil, fugaz, mais difícil se torna o sono. Existo na escuridão com a ansiedade ao lado, procurando viver em pesadelos, vendo-os como mais fáceis de aceitar do que nós. Não sei dormir sem um amanhã.

Concluo que somos um delito. Somos uma falha existencial de planos falhados e caminhos procurados à força na pressa de aproveitar as horas ao sol. Passamos tanto tempo a fugir sem ninguém nos perseguir a não ser a nossa consciência do caminho que percorremos. Estamos em terras geladas com luzes encadeadas pelo próprio brilho. Não quero olhar. Mas sinto o peso da obrigação de olhar em frente e tomar uma decisão perante uma bifurcação. E pesa cada vez mais em mim. 

O sono teima em vir. Prefiro os pesadelos ao sonho de ti.


Vulkan - Blinding Ornaments

terça-feira, 26 de julho de 2022

Contra-o-tempo

Corremos contra o tempo,
Vemos o avião voar e a esperança a escorraçar
O que foi dito e contido em horas do desmentido.

Fomos um contratempo,
Um entretém no vai não vem do bafo do Verão,
Uma fonte de lazer dilacerada e deliciada no âmago do prazer.

Já dizia o velho do Restelo,
Que acreditava no insucesso em tudo de excesso,
Que navegávamos vaidade ao sabor da nossa leviandade.

Que drama mais belo,
Viver e crescer, aproveitar e no fim chorar
A simbiose de nós em tão curta dose.