terça-feira, 31 de maio de 2011

O príncipe cruel

Do seu alto trono ele observava, silencioso, esperando notícias do que quer que fosse. Coroa na cabeça e ceptro na mão, sentado, eternamente, ele esperou. Da sua história eu partilho um bocado, o que vi, o que senti, o que ouvi. Com calma chegaremos ao entendimento da minha devoção, começando por o odiar, depois por o entender, sem que dêem conta já o terão na mente de bom grado e finalmente darão a vossa palavra de lealdade para com este rei que há muito se rendeu na sua última e derradeira batalha, a sua vida.
Começando a fábula, há muitos Invernos atrás, não vale a pena conta-los, só nos atrasaria na história, existiu um reino governado por tiranos. Geração atrás de geração, tirano atrás de tirano, eles vivam para o seu prazer, roubavam ao seu povo, violavam, provocavam guerras e alimentavam-se do sangue que faziam derramar em seu nome. Este rei foi mais um dessa linhagem. E sem dúvida deixou os seus ancestrais orgulhosos. Continuou a sua tradição. Talvez nem a tenha continuado mas sim dado-lhe uma nova definição, mais violenta, mais sangrenta, menos nobre.
Aos seus tenros dez anos, sendo educado nas várias artes da espada ao mesmo tempo que aprendia novas estratégias de guerra, este jovem príncipe foi chamado pelo seu pai que lhe propôs um desafio, um teste às suas virtudes e ao seu direito ao trono. Teria de matar o seu melhor amigo. Ele fê-lo, de bom grado. Nem um momento de hesitação. Colocados frente a frente na arena, apenas o seu pai como público. O seu amigo tremia, chorava, berrava que não o queria matar, que queria muitos mais anos ao seu lado, a servi-lo fielmente através dos tempos com a sua espada e escudo. Ele, jovem e sádico, com um sorriso rasgado na face, olhos psicopatas que seguiam todos os movimentos do seu amigo. Avançou e apenas um assobio do vento avisou o movimento da espada mesmo antes desta entrar pelo peito do amigo antes de sair e cortar a garganta ao jovem enquanto que este abriu os olhos o máximo que conseguia numa expressão de incredulidade.
Meses e anos passaram e ele sempre viveu feliz com a sua decisão naquele dia. A partir daí até os seus servos tinham medo de serem mortos de um momento para o outro, servos que sempre o amaram e lhe deram o carinho que ele não recebia do seu pai. Depois disso, nunca mais.
Aos quinze marchava para a sua primeira batalha. Mestre do seu contingente, ordenou-os e destruiu os seus inimigos. Com tácticas superiores que ele próprio desenhou por noites em claro derrotou os seus adversários numa questão de minutos, o seu pai a ver ao longe sentindo um misto de orgulho, surpresa e medo. Os que sobreviveram e se renderam viveram tempo suficiente para se arrependerem da sua decisão. Ele prendeu-os e torturou-os pessoalmente, por gozo próprio, retirando apenas informação de onde viviam. Assim que eles suplicassem que parasse e lhe jurassem lealdade ele abria-os e tirava-lhes o coração com as mãos enquanto eles gritavam de agonia. Um último suspiro de alegria por o terror ter acabado e fechavam os olhos. Durante as noites ele levava um grupo de soldados e destruía as aldeias dos mortos, deixava os soldados saquear tudo o que quisessem enquanto ele violava as mulheres dos seus falecidos prisioneiros. Depois cortava-lhes as gargantas enquanto elas choravam encolhidas em cima da cama.

Introdução ao rei

Ainda a noite aclara e já se ouve um novo som de aviso. Vem aí uma nova tempestade...

segunda-feira, 30 de maio de 2011

A rua através da janela alta

Olhar frio pela janela alta para a rua desconhecida lá fora. Cá dentro há um calor antigo que dei como falecido há muito tempo. Memórias que se desvaneceram com o tempo, talvez não tenham sido fortes o suficiente para cá ficar, só deixaram a impressão na mente para não me esquecer que vivi naqueles tempos. Fico nesta janela a olhar lá para fora enquanto a chuva cai e ela desespera por reconhecimento cá dentro. Deixo-me ir na corrente de pensamentos que me atravessa a mente neste momento, não deixo de admirar a rua. Esta rua que é uma parte integrante da alma de Lisboa e que eu desconheço, sendo cidadão da mesma, partilhando a minha alma com esta cidade. E ela vive aqui. E eu desconheço-a. Conheci-a em tempos passados. Mas esses tempos passados foram lavados por tempos mais recentes e agora já não distingo a sua face da multidão. Chove cá dentro enquanto chora lá fora.
Novas emoções percorrem-nos todos os dias, é algo natural, não o podemos evitar. Podemos, no entanto, repetir o ciclo. A informação chega-nos ao cérebro e é assimilada. Se a melancolia nos conquista nada podemos fazer para evitar sentir falta do que já tivemos. Tenha sido um sorriso, uma caminhada pelos vales e montanhas que rodeiam as casas de Verão, uma volta de bicicleta para algures mais escondido para mostrar um sorriso reservado. A melancolia cai-nos pesadamente no dia e rasga-nos a alma. Não o podemos evitar. Tal como não podemos evitar o tempo passar e a vida mudar-nos. O que ontem foi alegria hoje pode ser indiferença. Tudo muda e a falta de contacto distancia-nos tanto até ao ponto de sermos irreconhecíveis um para o outro. E por isso não se pode dizer que não mudei. Tirando o cabelo, a barba, os óculos, ect. Mudei, nem que tenha sido interiormente. Abri os olhos, por assim dizer. E fechei a boca. Suspiro. Ela mantém o seu olhar incrédulo, boca semi-cerrada, à espera de algo em mim que mostre que tudo o que disse é absurdo. Mantenho-me quieto.
Não a posso culpar pela falta de contacto. Foi tanto culpa dela como minha. Nenhum de nós procurou o outro durante toda esta década. Seria injusto deixar a culpa toda nas costas dela e esperar que ela carregasse esse fardo ao mesmo tempo que procurasse uma forma de voltarmos ao que éramos. Por isso abro uma porta na minha alma para que ela volte a entrar, uma hipótese para que, com o decorrer do tempo, com muita conversa e passar de novo pelo processo de nos conhecermos, consigamos ser outra vez amigos e passar não apenas uma década assim mas muitas mais. Através da tarde e até depois da chuva acabar e a rua escurecer de vez histórias são contadas e dá-se como terminada um tensão, um nervosismo que dominava a nossa conexão. Agora somos mais do que meras memórias do passado, somos companhia do presente que observa a chuva primaveral a cair através da janela alta na rua da alma da cidade, uma parte minha, outra dela. E o adeus foi simples, amanhã choverá outra vez certamente.

sábado, 28 de maio de 2011

Através dos bosques

Sinto uma tranquilidade crescente, chegando tardiamente, através da noite, pela melodia. O som das flautas e dos violinos fazem-me ver as árvores que tapam o Sol, numa tarde que anuncia o seu fim num mundo apenas meu. As teclas do piano fazem-me olhar em frente e ver o lago que tranquilo dorme esperando a noite para inundar os meus sonhos com visões do amanhã e memórias do ontem. As mãos passam pelas cordas da guitarra clássica e o som sai tão naturalmente, deixando-me tão confortável, entrando na casa de madeira que construí com a minha mente, à orla da floresta, à beira do lago, aqui está o meu coração, onde ecoa a melodia de tempos em que os meus pés não tinham pisado a terra, oferecida a nós, ainda por fazer merecer tal honra.
A mente deriva e uma pergunta deriva no ar: que é um Homem sem a sua fé, qualquer que seja ela, mesmo não sendo uma crença religiosa, apenas uma filosofia, um objectivo, um caminho? Um homem quebrado. Tal como me sinto agora. Agarrado ao passado, esperando que este se venha a encontrar com o futuro. E um homem quebrado não tem vontade, não tem forças. Por isso derivo conforme o vento sopra acima da água do lago, deixo-me ir porque a corrente é demasiado forte. E espero encontrar uma cascata que me force a parar e retomar o meu caminho ou que me deixe cair para o mais pequeno recanto da floresta e aí meditar, acalmar, durante dias e noites. Talvez depois volte a andar e tentar encontrar o caminho para casa onde a música paira no ar, esperando por mim, debaixo de chuva ou Sol, dia ou noite.
O bosque esconde-me de tudo o resto lá fora. E tudo o resto lá fora é uma parte de mim que deixei para trás. Não deixa saudades. Talvez até deixe mas recuso-me a encara-lo tão facilmente. E deixo as sombras das árvores abaterem-se sobre a minha casa, serenando-me o espírito com canções de segredos e de tempos para vir, profetizados por tantos que apenas em lendas sabem ser verdadeiros. Ao som dessas canções pesam-me as pálpebras e fecho os olhos, durmo um sono profundo que sei ser leal. Sonho dentro de um sonho, com dragões, castelos e cavaleiros, poções mágicas e feitiços. Desenlaces de vidas passadas que sei na minha mente serem minhas e de mais ninguém. E não espero que mais ninguém compreenda o seu verdadeiro significado, apenas por bosques vagueando e nos bosques se perdendo encontramos a alma que julgámos há tanto tempo perdida.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Hoje as saudades batem

Hoje as saudades batem à janela como a chuva que se esqueceu de cair durante o Inverno. Batem fortemente, consolidam a escuridão da noite. Trazem um horizonte turvo, imensamente iluminado por prédios e lâmpadas de rua distantes. Trazem lágrimas aos olhos que reprimo com o máximo esforço, levam o punho à parede e o sangue à mão agora distorcida, em breve inchada. Rapidamente se alastram pela mente como um rio cuja nascente é a alma. Passam memórias, visões, tempos passados que depois de tanto tempo enjaulados gritam, libertos da tirania da supressão de alguém que foi magoado e ainda não recuperou totalmente. Controlam a noite e movimentam-me as mãos, fazem-me preferir estar sentado na escuridão a partilhar a luz com outrem.
Desenhos na parede, deformações dentro da mente que foram vomitadas cá para fora, violentamente crescendo dentro de si, um gato que caminha levemente e se aconchega na cama, um imenso quarto com fotografias, memórias, traições e felicidades. Nunca tive hipótese de o explorar. Sempre imaginei, no entanto, estar a dormir com ela nos meus braços, o gato no fundo da cama, deitados num canto do quarto com a parede a branco a implorar-nos para a preencher com o resultado da nossa simbiose. Era esse o sonho. Até um dia maligno de Inverno ele ter sido apagado forçosamente e trocado por um vazio doloroso que ainda não foi eliminado. No dia seguinte apenas a chuva torrencial conseguiu aparar a mágoa com que ainda me debato.
Hoje as saudades batem à porta. Familiarizadas com o quarto, sentam-se num quarto e lá ficam, lentamente morrendo, levando-me com elas para uma escuridão a que já estou habituado. O tempo passa, continuamente, aqui nada muda. Não mudo eu, não muda o espaço, não muda o ar que se respira. O quarto mantém-se igual desde que ela cá passou, uma noite perfeita que consegui olhar-lhe para a profundeza dos olhos e tocar-lhe na alma. Dormimos juntos e na manhã seguinte ela entrou no barco e caminhou para as brumas que escondiam a sua casa. Deixou-me para trás, desolado, querendo um pouco mais da noite que morreu. A memória leva a mais um quadro de palavras na mente e tudo é deixado para trás. Amanhã terá novas caras e novos acidente da vida. Mas ela permanece aqui, no seu trono, intocável, imutável.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Aos ventos

Que traz o vento na sua correria? Devastação, claramente. Desespero, subtilmente. O reflexo do vazio que nos percorre interiormente, talvez. É incerto, não se consegue dizer com segurança. Cada um sente algo diferente e o vento percorre com um fúria dentro de nós que tanto nos pode conquistar como afastar. Para mim é algo que me empurra para trás, uma força invisível que me afaga o cabelo ou que me refresca quando o Sol parece desejar pegar-me fogo. Traz-me frio aos ossos e enregela-me a pele, ajuda as folhas a cortá-la. É um amigo no Verão e um inimigo no Inverno. Nos intermédios é uma conhecido que lembro com saudades ou que me preparo para afastar.
Porque corre o vento? Quem sabe? Tenciona estar nalgum lado, tenciona controlar quem passa por onde, ajudar o destino a concretizar-se, abraçar alguém, quem quer saber? Lá fora ele sopra, forte ou fraco, não interessa. Serena-me a noite, permite-me entrar no sono. E aí, apenas aí, agradeço-lhe. A sua presença refrescante nas quentes noites de Verão em que os lençóis existem apenas para queimar a pele, quando andar sobre o luar ainda nos faz querer tirar a roupa, deitar na areia, dar um mergulho na água, é essencial, benéfica, bem-vinda. E altera a nossa mente, permite relaxar, tranquiliza a alma. Paramos para olhar para o horizonte, porque podemos, porque estar parado já não é tão exaustivo. É um abraço amigável e fresco numa noite tão abrasadora.
Deixando Boreas abandonar o seu posto como líder do céu, dando o seu lugar a Zérfiro. Deixando o Verão aproximar-se, a alvorada chama por aquele que aclama os Ventos muito depois de a humanidade ter perdido fé nestes e estes terem deixado os humanos à mercê da sua indiferença.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Medo

O espaço conquista-se nas ruas,
Na sua bela, profunda escuridão,
Demonstrando tudo o que o coração sente,
Sempre receoso, escondido,
Por cidades e vilas que reclama suas,
Em poemas de tristeza e solidão,
Tentando acreditar no que diz mas sempre sabendo que mente,
À sua falsidade rendido.

Observando o oceano e vendo aproximar as brumas,
Foge em pânico por meio da confusão
Alastrada na rua pelo povo inconsciente,
Movido por um medo desmedido,
Receando o poder escondido das luas
Passadas mas que ainda a mente e o coração conquistam,
Concebidas para dar força a qualquer crente
Com o seu lugar nas estrelas merecido.

Ali se encontra um lugar
Onde se pode sentar e descansar,
Por pouco tempo e mal contado,
Por medo negação criado.

domingo, 22 de maio de 2011

Se encontrares um pequeno espaço na multidão em que possas erguer a cabeça e respirar, aproveita porque eu estou tão afundado no peso da sociedade que já não consigo olhar para outra coisa que não os meus pés...

Vazio

A verdade é complicada. É um espelho distorcido da mentira. Ou talvez até seja o contrário. Mas é essencial, para a maioria. O problema é que a maioria não sabe distinguir a verdade do mundo da verdade pessoal, do seu desejo. E por isso caminham ignorantes, esperançados ou negativos. E não sabem se estão talhados para receber a verdade, não há propriamente um teste que possam fazer para saber se estão aptos. Resta-lhes apenas a vida. E a vida é um teste, não só de inteligência ou de força, é também de resistência. É saber sobreviver os dias mais duros e solitários e prevalecer, levantar da cama no dia seguinte. Levantar no dia seguinte é ainda mais fácil do que sobreviver ao dia. A menos que seja um dia igual ao interior. A vida é muitas coisas mas não é injusta. Nós somos injustos, não sabemos encontrar equilíbrio na vida.
O dia começa pesado se passamos todas horas a empurrar as pessoas para fora da nossa vida. Construímos muros à nossa volta que nos fazem reservar os nossos pensamentos para nós próprios, trancamos-nos dentro de um quarto sem janelas nem portas, afastado de toda a realidade, onde podemos gritar à vontade sem que ninguém nos oiça. O Sol pode brilhar lá fora mas não se vê nada cá dentro, apenas sombras que se mexem, dançam, riem, gozam. Freneticamente, à nossa volta, usam-nos, abusam, cansam-nos até ao ponto em que já não nos conseguimos levantar, as sombras habitam-nos a mente, preenchem os pensamentos e os pesadelos, imagens repetidas que nos deixam à beira do desespero. E as horas passam, não nos levantamos, não queremos enfrentar o mundo lá fora. Apercebemos-nos do vazio que é, que somos, que nos define. E definhamos na cama, com o tempo.
Toda a gente trai, de uma forma ou de outra. Toda a gente mente, depende da definição da verdade. A ironia disto tudo é que a morte leva consigo todos os erros e ofensas e limpa o cadastro da vida da pessoa, tornando-a numa pessoa perfeita que antes toda a gente detestava mas que depois toda a gente iria ter saudades. Mais mentiras para preencher o vazio no interior. No dia seguinte levantar-se-aõ da cama como se nada se tivesse passado, nada tivessem dito. Um niilismo existente no nosso código genético que nos leva a ser tão merecedores da minha falta de confiança de raiva. Hipócrita? Sim, completamente. Mas completamente confiante de que exponho a minha realidade quando requisitada, ainda que magoe alguém, ainda que afaste mais uma pessoa, sendo as consequências passar um dia sozinho e senti-lo como se uma eternidade fosse.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Cataratas

Descendo de novo estas cataratas, tão familiares. Elas simbolizam a minha procura por uma paz de espírito. E apesar de já cá ter estado tantas vezes, nunca cheguei ao final da queda, àquele pequeno lago onde se pode nadar tranquilamente. Desejo-o tanto. Silenciosamente, nas noites, nos dias, quando os meus olhos estão abertos ou fechados. Não importa. Vejo-me sempre no topo, a olhar para baixo e a atirar-me com ânsia. Mas o tempo fica paralisado, a água continua a cair, sem mim. E suspenso no ar, com um ar tenebroso e uma raiva que não consigo controlar, apresento-me eu. Não caio. Nunca caio. Apenas em desespero. Silêncio. A noite chegou e a rotina repete-se.
Em sonhos tudo se repete. A imagem é sempre a mesma. Nem o Sol, nem as árvores, nem a água, nem mesmo as pessoas variam. Todos permanecem lá, sem cara, sem voz, sem o meu consentimento. Mas sempre com a minha indiferença. Ainda não me são nada. Lá fora a noite prossegue, tal como na minha visão. No meu sono perturbado, os sonhos não acalmam. Não chega a haver uma mão que se pousa sobre a minha testa e me tranquiliza. Pontapeio mais e mais o ar, tento afastar-me deste gelo invisível que me agarrou a meio da minha queda mas nada parece resultar. E lá em baixo vejo pessoas a nadar, nem uma mão a estender-se para me agarrar, para me puxar para baixo. Acordo.
O meu quarto parece o mesmo. Mas há algo de novo. A luz do Sol rompe por entre as gretas do meu estore, iluminando as paredes que já tanta vez esmurrei e onde salpiquei sangue. Lá vejo, um novo dia nasceu. Que novo pode este dia trazer que não seja uma repetição? Trago vergonha aos meus pensamentos. Estas dúvidas não me vão fazer avançar. Mesma merda, dia diferente. A filosofia que me faz levantar da cama e caminhar para o dia disperso de rotinas que me aborrecem. Agora, com olhos abertos, sonho com as cataratas, elimino todas pessoas que se encontravam no fundo e troco-as por pássaros que cantam felizes algures na flores. Ponho os braços atrás da cabeço, fecho os olhos e penso "um dia vou descer, apenas tenho de deixar o tempo correr". E ele corre, tal como a água. Eventualmente também eu irei correr.

Ao sabor do vento, debaixo de nuvens cinzentas

O corredor era longo e estreito, apenas no final estava o objectivo da minha vinda. O vento soprava para dentro do pavilhão através das poucas janelas abertas e fazia com que o seu longo cabelo louro levantasse voo levemente, enquanto ela falava sorridente com as suas amigas. Esperavam pela hora para entrar na aula, falando alegremente. Ela continuava sem olhar para mim, aproximei-me rapidamente dela, agarrei-lhe no braço e perguntei-lhe:
- Posso falar contigo?
Gesticulei para que passássemos as finas mas altas janelas para o jardim. O tempo era frio, vento forte, nuvens negras, ia começar a chover a qualquer segundo. Mas isso não importava na altura:
- Deixa-me perguntar-te algo. Mesmo sabendo que ele nos poderia ver lá, porque é que arriscaste a ir comigo?
- Oh, não podia cancelar depois de já ter aceite o convite.
- Podias. Inventavas alguma coisa, adiavas até conseguires saber um dia em que ele não lá estivesse e marcavas para esse dia.
- Não me lembrei disso. Mas não houve mal. Porque perguntas isso?
- Foi a única coisa que não consegui arranjar uma explicação em que acreditasse.
Fitámos-nos durante uns tempos, os seus olhos azuis-safira com uma docilidade enganadora. Ela acabou por sorrir.
- Está bem, era tudo o que precisava de saber.
- Se era só isso, porque pareces tão zangado? Estavas à espera de outra resposta?
- Não, só queria perceber porquê. Mas desiludes-me. Sempre te vi como o tipo de rapariga forte, que não sentia a necessidade de responder a alguém. No entanto andaste todos os segundos comigo cheia de medo de que ele nos encontrasse, sem que nós estivéssemos a fazer nada de mal nem vocês estando numa relação.
Parecia chocada e zangada, pronta a bater-me ou ainda pior, virar-me costas e nunca mais me falar.
- O que eu faço, digo ou penso não te diz respeito. Nem sequer me conheces.
- Verdade.
- Mas então responde-me tu a isto, porque quiseste tu sair comigo?
- Porque vi qualidades em ti que gostei.
- É? Tais como?
- És independente, és inteligente, bonita, determinada e reservada. Muitas vezes mentes para que não tenhas de revelar o que sentes mesmo mas acredito que consigas ser directa e honesta quando chegas a um limite ou quando a pessoa não te diz nada. Ultimamente tenho vindo a descobrir mais mas não interessa...
Ficou quieta, calada, os lábios semi-abertos, a olhar para mim ainda à procura de uma resposta à altura.
- Não te vou dizer como viver. Não é a minha responsabilidade. As opções que tu tomas são tuas e apenas tu terás de sofrer as consequências das tuas acções.
A este ponto ela estava à beira de chorar.
- Porque é que me estás a tentar magoar?
- Não te estou a tentar magoar, estou apenas a ser honesto contigo. Não te vou forçar a abrir e a amar. Sei que te fechaste e que mentes para não te magoares, todas pessoas do sexo masculino que entraram na tua vida abandonaram-te e isso ainda te magoa. Mas é disso que a vida é feita. De mágoa. A capacidade de respondermos à dor, levantarmos-nos do chão e continuarmos a viver a vida abertos e disponíveis é que mostra a nossa qualidade como pessoas. É isso que marca a nossa humanidade. E por mais que tentes, por mais tempo que passe, vais eventualmente sentir a vontade de arriscar algo com alguém. Suponho que só estivesse com a esperança que esse alguém fosse eu.
Disse-lhe estas últimas palavras, virei-lhe as costas e iniciei o meu caminho de volta a casa. Agora não sei o que vai acontecer, suponho que apenas o tempo vá dizer.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Folhas a florescer

Esta cidade tem um cheiro singular,
Algo que paira no ar matinal,
Uma sensação particular,
Que não tem nenhuma característica especial.

A quem souber parar e cheirar
Esta já não doce brisa
Que paira no ar
É alguém por quem o mar acalma e da tempestade avisa.

E quando esta chuva parar,
E estas nuvens carregadas desaparecerem,
Finalmente poderemos respirar
E apreciar o Sol a aparecer e as folhas nas árvores florescerem.

terça-feira, 17 de maio de 2011

O velho caminho - final

Os meses seguintes correram. Literalmente correram. Uma tarde parecia resumida a um minuto, cheio de magia, encanto e amor. Andámos, falámos, corremos. Fizemos de tudo um pouco daquilo que se espera de um casal. Aproveitámos o final da Primavera e o Verão ao máximo, tal como prometemos naquela noite. As melhores férias que tive até hoje. Jantámos juntos, conhecemos os amigos um do outro, permanecemos os mesmos e mudamos-nos um ao outro. Enfim, amámos. Mas rapidamente a felicidade se torna tristeza e o dia em que estava destinada a ir para França chegou. Então fiz a mala, chorei muito mais, ele beijou-me muito mais, o tempo finalmente pareceu parar de ter pressa e deixou-nos apreciar o momento. Deitámos-nos em cima da minha cama, malas no chão, nas últimas horas antes da altura de ir embora para o aeroporto. Antes de sair, tempo para uma última promessa:
- Durante o caminho e até nos separarmos, nada de lágrimas. Combinado? - ele sorriu, deu-me uma festa na cabeça, um beijo na testa e outro nos lábios e simplesmente respondeu... - Sim.
Levantámos-nos da cama onde estávamos enrolados, peguei nas malas dela e saímos pela porta, descemos pelas escadas para durar mais, entrámos no carro e pusemos-nos a caminho do aeroporto. O caminho todo a olhar um para o outro, nem via o meu reflexo nos seus olhos, apenas a sua profundeza azul. Ambos sorriamos, até aqui a promessa não foi difícil de cumprir. Mas assim que vimos o aeroporto tudo se tornou mais difícil, o coração pesava, batia mais depressa, havia uma dor no peito que não conseguia explicar. Sem conseguirmos explicar como, o carro estava estacionado, eu estava a tirar as malas da parte de trás do carro, o silêncio era ainda mais duro, a dor era maior que a alegria. A realidade finalmente caiu sobre nós.
O caminho do carro para o aeroporto parecia uma eternidade. Por um lado estava feliz com isso, parecia que estava mais tempo com ele. Por outro lado sabia que isso não era verdade e que o tempo era limitado, muito limitado. E isso deixou-me muito infeliz. E quanto mais longo parecia o caminho, mais miserável eu me sentia. Felizmente ele estava lá para afastar todas as minhas mágoas. Deu-me a mão, olhou para mim e forçou um sorriso, ainda que visse que era triste, sabia que ele estava feliz simplesmente a estar ali comigo, por mais limitado que o meu tempo fosse. Fez-me esquecer todo o pesar que residia actualmente na minha mente. É esta a sua magia, tem uma maneira de me tranquilizar. Mas chegámos, infelizmente.
Entrámos por aquela porta gigante que roda. Rimos um bocado quando quase tropecei por andar depressa demais. Mas entrámos. Ficámos ali parados por momentos, a observar as inúmeras pessoas, cheias de pressa, sem sentirem nada do que nós sentíamos naquele momento. Os pais dela foram gentis o suficiente para nos deixar ficar ali um bocado, deveriam conseguir ver nas nossas caras a mágoa da despedida. Finalmente ganhei força e coragem para caminhar em frente, peguei-lhe na mão e lá seguimos. Ela despediu-se dos pais, deu-lhes garantia de que iria contacta-los assim que lá chegasse. Olhou para e não resistiu mais, desmanchou-se num choro frenético, agarrou-se a mim e quis-me prometer que nunca mais me ia largar mas parou a meio, só iria doer mais. Beijámos-nos e abraçámos-nos durante um tempo até ela me voltar a virar as costas e passar por aquela porta até que a deixei de ver. Deixou em mim as lágrimas que não me deixou ver.
Entrei no avião, sentei-me, chorei com vergonha. O capitão falou, as hospedeiras fizeram a sua habitual coreografia, avisaram-nos de que íamos levantar voo e para apertarmos os cintos. Finalmente levantámos voo e eu fechei os olhos, não tive sequer coragem para dizer adeus...
Voltei para trás, olhos vidrados, a minha última recordação são as suas costas a desaparecerem. Voltei para casa em silêncio no carro dos pais dela. Nem mais um lágrima deixei cair. Depois só me lembro de chegar a casa, deitar-me na cama e acordar às cinco do dia seguinte, sozinho na minha cama. Agora é outra vez Setembro e viajo pelo mesmo caminho, olho para a mesma estrada, no mesmo autocarro. A única diferença agora é que quando olho para o outro lado já não a vejo, com a sua cara séria, a olhar para as árvores e arbustos que passam, no seu próprio mundo. Mas sorrio porque a minha última recordação dela não é a única e apesar de ela não estar aqui agora sei que estará em breve. E eu quero ficar aqui à sua espera. Até lá leio a carta que ela me deixou quando nos abraçámos no aeroporto, a dizer que me amava, que voltava no Verão e no Natal e que isto não era um adeus, era um até logo...

O velho caminho - noite

Volto a casa, tranquilo, sereno, feliz. Sorriso na cara e demasiado envergonhado para falar mas projecta-se nos meus olhos uma esperança, uma visão do que quero que o futuro seja. Talvez seja tolo e demasiado velho para estas coisas mas estas coisas são novas para mim, penso que posso honestamente dizer que nunca me senti assim. A conversa das outras pessoas ao jantar é distante, a voz dela permanece-me na memória durante todo o tempo e a sua imagem faz-me sorrir sem parar. O vento podia ser violento lá fora, a chuva podia estar a cair sem parar mas eu continuaria a querer sair e ir ter com ela. Felizmente não é esse o caso. Está calor, céu limpo. Posso sair de casa de t-shirt e caminhar confortavelmente até à casa dela. Mal posso esperar pela hora de o fazer. O jantar acaba e eu preparo-me para sair. Depressa me arranjo e pela porta fora saio para as ruas que parecem intermináveis nesta noite até à sua casa.
Chego a casa. Uma sensação nova, confusa, deixou-me ansiosa e nervosa. Mas feliz. Definitivamente feliz. Vou para o meu quarto, deito-me na cama, agarro-me a uma almofada e penso na solarenga tarde, na sua voz grave, no seu cabelo longo a esvoaçar com a prematura brisa de Verão, nos seus olhos bondosos e sorriso honesto. E sem me aperceber fico eu com um sorriso na cara. Encolho-me e fecho os olhos. Estou num estado puro de alegria. Interrompem-me o momento, batendo-me à porta, a chamarem-me para o jantar. Sento-me à mesa, como distraída, o silêncio domina a sala mas não me perturba. Não hoje. Em qualquer dia seria razão para me enfurecer e querer despachar para o quarto e fechar-me lá a ouvir música. Mas não hoje. Estou demasiado feliz. Pouco tempo passa até me aperceber que o meu pai estava a falar, dirigido a mim. Tinha uma expressão séria e dura, mais do que o normal. Não, não pode ser, não hoje...
Chego à sua casa, mando-lhe mensagem para o telemóvel para descer e aguardo nas suas escadas mais ansioso que antes. Espero pouco, ela desce e sai pela porta do prédio. Desce as escadas e fica ali inerte, de costas para mim. Como disse, sou demasiado tolo. Esperava um abraço, um beijo, sei lá, até me contentava com um sorriso. Mas tudo o que via dela era a sua nuca, cabelo preso, como sempre até hoje. Permaneço ao seu lado e pergunto-lhe o que se passa:
- Vem comigo. - continua sem olhar para mim, com a cara rígida, como se tivesse acabado de descobrir que alguém próximo morreu.
Caminhamos na direcção da mata, vamos para o mesmo sítio onde vimos o Sol a pôr-se nesta tarde. Ela senta-se e olha para o horizonte com os olhos em lágrimas. Alarmado, sento-me imediatamente e volto a perguntar:
- O que se passa?
- O meu avô... - foi tudo o que ela me conseguiu dizer antes de se desmanchar em lágrimas. Puxei-a para perto de mim e agarrei-a com toda a força possível sem que a magoasse. Dei-lhe tempo para chorar tudo o que tinha a chorar e arranjar a coragem para me dizer o que se passava.
- O meu avô - recomeça ela a falar, mais calma - quer que eu vá para França estudar, ele acha que lá as universidades são melhores. E os meus pais são tão fracos que concordaram automaticamente. Nem deram luta. Nem me pediram opinião. Simplesmente disseram que sim.
Ela volta a chorar e agora sou eu que fico catatónico, a olhar para o mesmo horizonte que ela, a esforçar-me para não chorar também. Lá se foram os meus sonhos e visões do futuro, agora reluzentes no meu olhar, a escorregarem-me pela cara até ao chão em forma de lágrimas. Todos eles simplesmente destruídos, existiram em vão.
Ficamos ali agarrados em silêncio durante toda a noite e prometemos aproveitar ao máximo os poucos meses que restavam até nos separar-mos. Esta noite foi a pior e a melhor da minha vida, foi o dia mais completo, o dia em que posso realmente afirmar que fui dona de mim mesma e que conheci alguém que o reconheceu, aceitou e que se apaixonou por isso.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Luz da razão

Fecha a porta, entra na escuridão. Tudo o que dizes sentir, todas essas mentiras que nos contas e esperas que acreditemos, achas que algum dia as sentirás? Contra ti todo o mundo se virará, a qualquer tempo, e eu estarei lá para te ver a cair no chão a chorar. Afasta-te de mim, não consegues olhar-me nos olhos sem mentires, és fraca, és reles, és o reflexo do que temo ser. Deste-me finalmente uma razão para me libertar, doce vento tanto aclamado por entre estas ruas pelos embriagados. E como a doce brisa de Verão, passaste por mim, acenaste e foste-te embora, voltaste no Inverno, fria e cruel. Visto-me para a minha protecção, contra ti caminho e tu cortas-me a pele e a alma. Lutas tanto para permanecer sozinha, não tens vergonha de deixares para trás a vida? Mas quem sabe, se calhar estou enganado, ainda estou cego esperando que sejas brisa de Verão outra vez. Aí a vergonha é minha. O que interessa é que no final permaneces sempre de cabeça alta, mesmo que te apeteça desistir.
Vem mostrar-te, se fores capaz. Mostra-me os teus olhos vazios, tristes, a tua alma destroçada que já não espera por nada, que afasta tudo o que se aproxima. Caminha por este descampado, não há aqui sítio para te esconderes, para onde fugires, aqui é a tua maldição, talvez a tua campa, diz-me a verdade, onde está o medo? Revela-te com a cara lavada, a chuva não te vai lavar as mentiras para longe, elas permaneceram sempre nas memórias de todos os que enganaste. E tristeza a minha, pertenço a esse ignorante grupo. Deixei-me levar pela tua beleza, levei-me a pensar que eras alguém que eu desejava sem ver quem eras na realidade, se calhar nem te dei hipóteses de te revelares. E agora vejo-te a jogar com alguém novo, esforçando-te ao máximo para manter perto os que iludiste no passado. Seduziste-me sem te teres esforçado minimamente, viste-me destruir-me com um sorriso nos lábios, usando a minha lastimável inocência e gigante carência. E agora mal te consigo olhar nos olhos, raiva que tenho de ti e de mim, olhando com saudades para os sonhos do que poderia ter sido quando te achava quem não eras.
Abri os olhos esta tarde. O Sol estava escondido e a trovoada voltava a berrar a sua dor pelos céus fora. A chuva caía e batia contra a minha janela, uma amiga a convidar-me a brincar lá fora para me distrair. Apercebi-me de que pensar em ti não vai fazer com que uma caneta se mexa e ainda há muitas páginas a preencher. Ficar aqui deitado à espera que tenhas a coragem de te abrires e falares com total honestidade é o maior desperdício que poderia fazer com a minha vida. Deixar o tempo correr em mim para meu proveito é o melhor que posso fazer. Conquistar a razão, dominar o intelecto, finalmente chegar ao meu lugar predefinido neste mundo, deixar-te para trás como uma má memória e mais um caso perdido de uma rejeição que me permitiu aprender de que a vida raramente faz sentido mas que tudo isso é relativo, o meu dia de hoje. Luz da razão que se abateu sobre mim neste dia.

Dia Mau - Ornatos Violeta

domingo, 15 de maio de 2011

Que seja...

Com que coragem me pedes o coração, sem me dares nada de volta! Como te consegues atrever a apresentar a tua face à minha resistência, inexplicável lástima que me conquista o coração em partir o teu agora. Já não oiço a doce melodia na tua voz, apenas pássaros que tentam sobreviver ao frio da noite de Inverno, permanecendo enjaulados aqui contra a sua própria natureza. Não conheço esta pessoa que te tornas, não acredito que tenhas cedido o teu ser ao monstro interior por inveja de não seres quem eu procuro. Nesta noite a obscuridade torna-se benigna, o silêncio é crítico, qualquer desculpa é suficiente para fugir daqui, de me afastar de ti.
Vivi esta vida até agora, curta e inexperiente, sem certezas confirmadas, apenas suposições e excessos de confianças. Não posso dizer ter vivido honestamente, nem sequer feliz. Apenas vagas ocasiões em que excedi a baixa fasquia que tenho, em que me permitiram deixar solta a minha autoconfiança. Mas tudo se revela agora nulo, a verdade é que palavras que eu digo são ditas cedo demais, a pessoas erradas. E não tenho como culpar outros, nem sequer sei olhar para mim mesmo e reconhecer o que fiz de errado. E tu? Tu acusas-me de tudo o que sei e do que não sei, retiras-me o pouco que penso de mim, sem poder ser categorizado como digno de confiança, tiras-me o que resta do meu ser. Tu denigres-me aos meus próprios olhos, cobres-me de vergonha.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Noite serena

Serena noite que me conquistas o coração, confessa-me uma vez mais o dia que me percorreu e esgotou, mostra-me se vale a pena acordar de manhã para ver o espaço vazio a meu lado. A verdade revela-se nua, poisada num banco de pedra no meio de um jardim. A sombra das árvores esconde-nos do calor do Sol e dá-nos alguma tranquilidade, permite-nos abrir os olhos e ver o que nos rodeia. O vento simboliza a calma que nos percorre no interior à medida que o dia passa. Deixa o tempo correr, passar-nos ao lado. Interioriza o que te digo, a noite está a chegar.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Garden in words

[Introducing the sight]
I see wind blowing through grass in the ground and leafs on the trees. I'm mesmerized by such beauty, speechless, unable to explain why I'm blessed with such a vision. Even if temporary, let me absorb this world in my mind to save it  for the time that my eyes die and so that I can savour it then to keep the smile in my face. I see the dead brown leafs dance happily a valse of death in this theatre that will go on after I leave this place and find my place under the earth. I hope then to love and dance like those leafs that enlighten my day, unlike the days that pass me by.
[Interlude]
Is it low merit to spend my day away with words in my blank page and not in my mouth? Is there someone to judge another human for the choices that he has made for his life, choices that affect him and bring pain to no-one else but him? I say, let him come forth so I may inflict pain in him with words, logic, fists and glades. Then let him try to judge again and notice the scars that I wrote and drew on him burning.
[Returning to the garden - presenting the enchanters]
Back to the garden, I cannot express better my admiration for this space. Even the sun shines of unspeakable power in this green creatures, worshipping them like the deity that has created them. This lifeful beings, seemingly dead, enchant with silent words the anthem of the Wood Nymph, loving protection of this eternal garden, spreading joy and growth in it's natural way. Under this Winter they live as if no harm could touch them or warmth could escape through their magical claws
[Expecting the Spring - leaving the garden]
Even now, so many days spent and closer to my death, they start to bloom as the clear sky announces the arrival of Spring. The wind still blows, life grows. Unexpectedly, or maybe even predicted, the garden blossoms in a perfect symbiosis of love and dedication. The Wood Nymph rejoices with this great work that brings words to this reserved mind and disappears into Summerland.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Goodbye to a friend

Life's full of goodbyes and none of them is fair. You walk this earth with the certainty that you'll be here tomorrow, even in those rainy days when tomorrow seems to take longer to arrive. And in one moment all is gone, the world's black and your friends don't now what happened, what to say to you. Everything's not fine. When you feel tired, when you just want to rest, you may not wake up again. Hold on to my hand, don't ever let go, you're too important, too significant in my life. Don't shut your eyes, it's not your time yet. Don't give up, there's more to this life than what you have lived. So much more to explore, don't close your eyes.
You tyrant of life, sick of the same happening over and over again. Again, you leave me alone, forever, until the end of my existence. Alone we we're one, together we were strangers. Strange, this life. Once you had eternal words, now your mouth is shut and you are cold. Just lying there, as though you were sleeping. Dressed in black, we're ready for another day under these blue skies. For me it will continue to be the blue skies the limit. For you, confined to this coffin, the earth will be the leader of your limitations, the worms will feed of your flesh and all that will remain of you will be memories.
Even now, life goes through me but doesn't reach you. Hold out your hand, I'll take you to Summerland...

domingo, 8 de maio de 2011

O velho caminho - tarde

Ah, finalmente, a doce brisa de Verão que já demorava a vir. Saio da sala, parece que passei lá mais tempo do que na minha cama durante a noite. Bom, a diferença não é muita. Só por dizer que passei mais umas horas a rebolar de um lado para o outro. Só dormi mais uns minutos do que o tempo daquela aula. Duas horas daquilo é tortura, especialmente com aquela professora. Podemos simplesmente estar a olhar para uma mosca poisada na mesa que ela interpreta isso como um insulto à sua pessoa e à sua aula. Não importa. Caminho de volta ao metro, regressando a casa. Chego um pouco depois do último autocarro ter saído e vi-me obrigado a esperar mais vinte minutos. Com música nos ouvidos até nem me importo. Até o Sol a bater-me nas costas me sabe bem.
As aulas demoram tanto a passar. Mas eventualmente acabam. Finalmente, hora de ir para casa. Apenas quatro horas depois de cá estar e já estou cansada deste sítio e destas pessoas. Há um limite até onde a minha paciência permite estas infantilidades. Já todas temos mais que idade para pensar em mais superficialidades do que rapazes do cinema e dos que andam atrás de nós. Deixo-as para trás e dirijo-me para a paragem, esperar o autocarro. O Sol está quente mas não desagradável. Talvez vá dar uma volta ao mato esta tarde, ver os resultados da Primavera, aproveitar este Sol antes que a chuva volte. Abro o meu livro enquanto espero mas o autocarro não demora. Uma tarde agradável de abertura ao fim de semana é o que me espera.
Já quase a meio do caminho para a casa olho para a frente. Cabelo loiro longo, olhos azuis claros, pele pálida, assim se apresenta ela e faz de mim um poeta com o desespero de um coração que não cabe no corpo. Ela olha para o lado repentinamente, já tinha reparado em mim antes. Volto a olhar lá para fora, nem uma palavra me ocorre para ir lá falar. Deixo estes pensamentos para o lado, tenho perfeita consciência de que sou demasiado velho para ela e ela é demasiado gira para mim. Para além de que a minha vida é uma ilha onde só se vê oceano. Está a chegar a minha saída, levanto-me, ainda olho uma última vez e ela tem uma cara furiosa. Deve ter um feitio simpático. Desço as escadas e começo a caminhar em direcção à minha casa, olho para o autocarro para a ver uma última vez mas ela não está já lá. Fico confuso mas continuo o meu caminho. Sinto um toque nas costas:
- Porque não me falas? - pergunta-me ela com a mesma cara furiosa que vi quando estava a caminhar para a saída do autocarro.
- Não sei o que te dizer.
- Podias começar por te apresentar.
Concordo mas antes de ripostar ela já começou a andar.
- Vamos para a mata. - diz-me ela sem olhar para mim, continuando a olhar e deixando-me com mil perguntas. Mas mantenho-me em silêncio.
Passamos a tarde a falar, ele diz-me pouco de si mas uma vida cheia de violência e dificuldades transparecem nos seus olhos. O Sol passa de um lado ao outro no céu, a temperatura é sempre agradável debaixo destas árvores e neste espaço, as horas passaram como segundos, isto confirma a teoria dele de que o tempo não é justo, não espera por nós. Tempo de voltar a casa, a noite está a chegar. A tarde da minha vida a chegar ao final.
Levo-a até à porta da sua casa e combinamos encontrarmos-nos à noite, dar uma nova volta. Olho para a profundeza dos seus olhos sob a luz do pôr do sol e beijo-a. Volto a casa e acaba a tarde da minha vida.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

O velho caminho - manhã

Vi-a hoje no autocarro. O dia começou normalmente, tinha acordado atrasado, feliz por chegar mais tarde à aula de português, mentalizar-me de que teria de me esforçar ao máximo para não adormecer durante a aula, o que significava tomar nota de tudo, até mesmo aquilo que já sabia ou achava desnecessário apontar, saber de que chegaria cedo a casa e aí começaria um novo fim de semana para relaxar um pouco os músculos e a mente. Caminhei pela mesma rua de sempre, vazia a estas horas, quase a chegar à paragem vi-me forçado a correr para apanhar o autocarro e ali estava ela, absorta desta realidade, a olhar pela janela, olhos azuis fixos no imaginário, com certeza a desejar estar noutro lado qualquer. Sentei-me no lado paralelo do autocarro, decidi que se ela não ia olhar para dentro e ver-me, eu também não iria ficar a obcecar com a sua existência. Olhei para fora e fiquei a contemplar o exterior, vendo árvores e carros a passar enquanto a minha mente andava à deriva.
Hoje o dia começou como qualquer outro. O despertador tocou, levantei-me, fui tomar banho, vesti-me, tomei o pequeno almoço e saí de casa. Dirigi-me à paragem e lá fiquei à espera do autocarro que pouco tardou a chegar. Entrei e sentei-me, de longe a controlar quem entrava no autocarro. Ninguém de novo, ninguém de especial. Mas vi-o. A correr em direcção do autocarro, num sprint frenético. Acho que nunca vi ninguém a correr tão depressa. Fiquei espantada. Mas deixei isso passar, já passou o tempo em que ficava à espera que ele reparasse em mim. Era uma miúda nessa altura. Agora cresci, já não tenho tempo para quem não me quer. Ele entrou no autocarro e esforcei-me por me manter a olhar lá para fora, para não fazer contacto visual. Continuei assim a viagem toda. Num breve momento de fraqueza olhei para o lado mas ele estava no seu próprio mundo. Suponho que tenha colhido o que semeei. É apenas justo. Volto a olhar para o exterior, a desejar que ele se sente ao meu lado, que se dê a conhecer, deixe a sua faceta de misantropo e que me deixei entrar na sua vida. Chegou altura de sair, nem uma palavra. Este dia começou mal.
Reconheço estes prédios, este lado da humanidade. Reconheço especialmente esta paragem. Ela vai sair. Olho para a porta e para lá ela se dirige, de costas viradas para mim, como passou a ser há já uns tempos atrás. Nem um olhar, que cruel. Ela desce as escadas do autocarro, lado a lado com a sua antiga melhor amiga, estão chateadas há já algum tempo, desconheço a razão. Nem me interessa. O que me interessa já não me acontece. O autocarro segue em frente tal como a vida, desinteressada em dramas de adolescência tardia. Chego à minha paragem, desembarco e começo a andar para o metro. O metro que está sempre preenchido de selvagens a fingir que se integram com a humanidade. Se for preciso, no pânico da sua ignorância, nem se importam em empurrar idosos e crianças para o lado. Egoístas, são os mais detestáveis do meu dia. O caminho a partir daqui correu normalmente, ninguém conhecido, alguns apenas de vista. Vou beber o meu café, relaxado, sem ele adormecia nos primeiros cinco minutos da minha aula. Dirijo-me finalmente à aula, resolvo sentar-me ao lado de uma colega semi-conhecida e ela põe-me a par da aula. Esta corre bem, nem tive de me esforçar para não adormecer. A caminho da seguinte, calculo que a história se repita nas próximas duas horas.
Ah, a mesma escola dos últimos anos. As mesmas amigas dos últimos anos. Bom, quase todos. De qualquer das formas, o dia acabou de melhorar. O resto do meu dia de ontem, o que deu na televisão, os novos rumores da escola, tudo normal numa manhã. Vamos para a aula, hora de nos concentrar-mos para entrar-mos para a faculdade no próximo ano. As aulas passam lentamente, carga mental cada vez mais pesada e finalmente cedo, distraio-me. Má ideia. Ele foi a primeira coisa que me veio à cabeça. Sacana desconfiado, fechado, casmurro, burro... que não se quer sentar ao meu lado, provavelmente não faço o estilo dele. Argh, não pensar nele, não pensar nele, voltar à aula! À eterna e enfadonha aula, esta manhã está a demorar a passar.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Confronto

Quem nos diz que a verdade é de facto verdadeira? Quem sabe dizer o que há atrás da cortina, tempo e espaço envolvidos num romance secreto? Digam-me que alguém se importa, que há alguém capaz de conduzir uma conversa honesta, sem me mentir à cara para ocultar o facto que preferiam estar noutro lado sozinhos do que aqui comigo. Mas a mim não me importa. É apenas a forma como sobrevivo. Quem não tem a coragem para me falar directamente, de não me mentir, não tem espaço na minha vida. Cretinos! Quem são eles para pensar que podem simplesmente entrar e sair conforme desejam? Não são ninguém. Não têm sequer forças para dizer o que pensam. Que fiquem por terras malditas onde o Sol não brilha, incompletos e ignorantes.
Impossível. Aqui é impossível passar a barreira da paranóia, conseguir ver para além do ódio que me enevoa a visão. Talvez apenas procure uma razão para me isolar, sinto-me melhor sozinho, sem mais ninguém a dizer-me o que fazer ou a quebrar o meu expediente de preguiça que defini como a minha vida. Mas isso não interessa, somos todos hipócritas e mentirosos, diariamente são-me dadas mais razões para me afastar, até eu próprio as ofereço. Se virmos a vida como um ramo de flores, eu pego nelas e pego-lhes fogo, chorando pela perda mas seguindo em frente no segundo seguinte, congelado no Inverno, esperando a Primavera para voltar a colher novas flores. No Verão tudo desaparecerá. Recomponho-me, rei da apatia, coroado em terras secas e vazias, produtos da minha imaginação fértil e prematura, sempre impedido de crescer, de descer à terra e enfrentar a realidade de frente: não sou ninguém neste mundo. Mas sigo em frente, esta aldeia vai arder e eu não quero estar aqui para ver o fogo de artifício.
Noventa por cento do meu dia é ficção. Porquê? Simples, passo mais tempo a imaginar a minha vida diferente do que a ver o que se passa à minha volta. Talvez porque a percepção do que me rodeia me venha facilmente, talvez esteja simplesmente infeliz pelas minhas voltas na vida, isso interessa mesmo? Mas na minha cabeça tudo é mais agradável, lá conquistei mais do que aqui. Lá tudo é mais simples, mais directo, honesto. Essa é a forma como eu vejo, não chega aos meus ouvidos o que os outros acham. Um simples jogo, é tudo o que é. Uma distracção de toda a merda que se passa pela vida fora, do que recebo diariamente dos que me rodeiam. E é um bom. Mantém-me vivo, desperto. Até porque tudo o resto faz com que a minha raiva seja justificada, qual é a vossa desculpa seus parasitas? Não me venham bater à porta quando as vossas lágrimas vos dominarem os olhos, não quero saber das vossas desculpas.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Dúvida

Sinto-me ridículo, sem palavras para descrever a minha ignorância à tua volta. Sem palavras, aí está uma boa descrição do meu estado. Tenho mais perguntas que respostas mas nem mesmo as palavras são muitas, tanto por explorar, um universo inteiro. Mas não sei se o medo de gostar do que descubro é maior de que és de facto um ser detestável, arrogante e superficial. Talvez te tenha fantasiado demasiado, talvez tenha colocado em ti aquilo que procuro sem que tu tivesses dado provas de tal. Mas não interessa, mantenho-me no meu inquietante silêncio, fingindo que a tua presença já não me diz nada. Até te empurro para qualquer outro só para te poder afastar de mim. Sai daqui, fazes-me odiar-me mais do que o reflexo no espelho todas as manhãs.
Fazes-me duvidar de mim, de todas as certezas que tive em tempo. Talvez precisa de uma ocasional chamada à realidade mas não uma tão extrema como tu fazes. Vou ser honesto durante uns momentos, encontro em ti uma beleza rara, divinal. Perco-me nos teus olhos e muitas vezes penso que não preciso de ver mais nada. O teu azul dominante que me observa parece-me reflectir nojo e arrogância. Fico simplesmente sem discernimento para me controlar perto de ti, faço de tudo para que me odeies. Levanto-me e vou em busca de cerveja, de uma razão para fugir dali, de algo para te mostrar de que não sou aquilo que possas vir a procurar. Preciso de respirar, de ter espaço de ti, voltar aos meus pensamentos sombrios, de conseguir olhar à volta e criticar toda a gente por não serem tu. Depois sinto-me fraco porque é a ti que espero ver, todas as vezes, a toda a hora, cada vez que alguém entra por aquela porta. Ridículo, só me apetece esconder.
Partículas, mínimas partículas distraem-me a tempo certo. Os meus pensamentos navegam para um niilismo necessário para o meu alívio. Retraio-me para o equilíbrio que necessito para funcionar, para racionalizar. Penso, "oportunidades são poucas, meu amigo, temos que as aproveitar". Uma epifania que me trouxe de volta à vida real, de volta para ti e a esta maldição de não conseguir falar, aproveitar o tempo contigo, agarrar esta oportunidade e simplesmente estar contigo. E aí lembro-me, nunca me chegaste a dizer que o silêncio é suficiente ou não. Óbvio que percebo que não seria de esperar tal de nós, o silêncio só é cheio de significado quando já se têm algum tipo de conexão. E eu estou bastante ciente de que isso não existe entre nós. Se o existisse eu já o saberia, tu já mo terias dito, melhor ainda, mostrado, com um sorriso. Mas então porque é que não consigo parar de pensar em ti? Não me vejo livre desta obsessão a tempo certo. Olho lá para fora e volto a olhar cá para dentro, já não cá estás.
Conquisto um estado de espírito para saber que o vou perder dentro de pouco tempo. Não sei se consigo aguentar esta constante extracção de fraqueza que me fazes passar cada vez que te vejo. Ainda não ultrapassei o medo de não te conhecer o suficiente para saber quem realmente és. Especialmente porque ainda recentemente me pareceste alguém que não ligava muito à superfície e agora me pareces como qualquer outra, alguém que não olha duas vezes para mim. E gostava de deixar tudo isso para trás, paranóia ou realidade, mas simplesmente não consigo, não enquanto não me estenderes uma mão e me deres um sorriso sincero.

Foge, foge amor

Esconde-te dentro das minhas veias, entranha-te no mais profundo do meu ser, traz à luz os meus segredos mais profundos. Revela o teu medo por mim que eu prometo-te esconder-te da minha raiva e violência. Não explores o meu lado psicopata, não está disponível para ser conhecido por ninguém. Deixa o meu sangue fluir, o meu coração palpitar, serás aquela que me faz morrer por instantes e lutar para voltar à vida. Liga-te à minha alma enquanto olho para as sombras à procura de refugio para toda a nossa situação. Deixa-me na minha misantropia que defino como conforto, sabes que não luto para mudar o que sou ou como lido a minha vida. Chora enquanto me conduzo por esta estrada de isolamento, apenas eu e a garrafa cheia. Abandonar-te-ei enquanto puder, tentarei não trazer mais dor.
Voltarei a virar-te as costas, vez e vez sem conta, se for necessário. Qualquer coisa para te tentar proteger de mim, do meu interior. Serás capaz de me trazer a felicidade que me mudará radicalmente a verdade? Não quero saber, não tenciono descobrir. Se algum dia viesse a tomar conhecimento do que me pudesses ser, diria que tinha nascido o dia mais vil que a minha vida poderia conhecer. E seria injusto. Para ti. Porque o que tu és para ti não corresponde ao que eu sou para mim e o que eu pudesse vir a ser nunca igualaria a diferença que farias em mim. Partir-te-ia, deixar-te-ia nos mil bocados que tantos falam sem sequer o sentirem. Talvez seja tudo apenas uma desculpa para fugir, para permanecer no meu estado de apatia e desdenho para com o mundo mas sei que uma parte de mim afasta-me de ti para te proteger de todo o mal que sei que te consigo trazer.
Foge, é tempo de correr para longe. Não há fronteiras no ódio e guerra, apenas mais razões para descriminar e matar. E no final isso é tudo aquilo que se precisa não é verdade? Simplesmente aceitar as diferenças ao ponto de as ver como uma coisa má e começar a tratar todos como inimigos. Deitamos tudo ao vento por um pedaço de sangue. Mas tu não, não pertences a nós. Somos uma matilha de lobos que se destrói por dentro, a sede de vingança e a falta de controlo sobre a nossa raiva toma conta de nós. Foge, foge meu amor, esta vida não é para ti. Este nós não te vai encontrar enquanto sair da sombra do ser nos assustar. Mas conto-te um segredo, a matilha sou eu e o sangue flui-me cheio de raiva e ódio por mim, descarregando-o depois sobre os outros. Um lobo com vergonha de viver, foge, é tempo de partires.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Volúvel e imutável

Quero viajar um pouco mais, quero conhecer um pouco mais. Quero sempre saber um pouco mais, ser mais do que sou, ter mais do que tenho. Um pouco menos de egoísmo e deitar o ego fora. Mas o orgulho é grande e difícil de engolir, nem sempre me é fácil seguir o coração. E aí penso, "é tempo de racionalizar". Mas pouco penso, a minha mão estica-se ao máximo mas ainda assim não chega até onde preciso, a minha mente fica aquém. E neste preciso momento necessito de parar de sonhar, de acordar e ver que nem um olhar me deitas. Mas não importa, imagens são imagens e palavras são palavras e tu não me dás qualquer uma. Por isso quero um pouco mais. Seja aqui, seja em qualquer outro lado. Mas, para ser honesto, prefiro noutro lado. Qualquer lado que não este. Não por ti, pelo menos não totalmente. Mas também por ti, parcialmente.
Quero ver um pouco mais deste mundo, absorver um pouco mais daquilo que ele me tem a oferecer. Quero arranjar coragem para sair de casa um dia e viajar sem destino, caminhar durante horas, não ter objectivo. Tento mas penso, "estou mais confortável aqui". E aí desanimo. Principalmente porque me apercebo que sou infeliz aqui, não só porque não me satisfaz o que me rodeia, mea culpa, mas também porque cresci para ser longe do que poderia ter sido, ou pelo menos do que me fizeram acreditar. Relembro, fiz de uma das minhas várias filosofias de vida nunca me arrepender das minhas decisões sem uma boa justificação. E não me arrependo de ter vivido a vida, segundo a minha definição pessoal, que não se aplica a mais ninguém. Claro que de vez em quando me pergunto se algumas coisas poderiam ser diferentes agora se tivesse agido desta maneira ou feito isto ou aquilo de outra forma. Mas livro-me desses pensamentos rapidamente, não gosto de pensar em ses.
Encontro-me aqui, talvez mais corpo e menos alma, uma mente constantemente ausente. Repetindo as mesmas palavras, no mesmo espaço. Se procuro rumo, não sei se é o correcto. Se me mantenho neste tempo de vivência não saberei do que poderia ter sido. Mas olho, vezes sem conta, para outro lado. E o que vejo classifico ridículo. Censuro-me imediatamente, vendo hipocrisia. Não sou, nem nunca serei, se alguma vez o procurei ser, foi um erro meu, perfeito. Mas acima de tudo aceito-me. E é isso que me faz olhar em frente quando só me apetece cair por terra e deixar tudo para trás. Talvez isso seja uma coisa boa, dá-me força e confiança. Mas talvez seja uma coisa má, distancia-me de todos, aleija os que me rodeiam, impede-me de crescer com erros de outros. Faz-me apático. Mas faz-me pensar, no silêncio com que me consigo rodear. Chego a uma conclusão muito importante: a minha cor preferida é o cinzento, porque nem tudo é preto e branco.

domingo, 1 de maio de 2011

A verdade ao Sol

Somos alvos de uma canção, somos balas da alvorada. Uma terrível chamada, uma escolha errada, aqui permanecemos, cegos e inúteis. Inconscientes, para dizer a verdade. Mas já ninguém diz a verdade, seremos então perfeitos. Não temos que revelar quem somos, escondidos na noite, afastados do dia. Mas escolhemos fazê-lo, porquê, não sei. Ainda assim, por entre terras metálicas e montanhas mais altas do que conseguiríamos alguma vez escalar sozinhos, damos as faces ao Sol e cumprimentamos todos os desgostos, crimes e dores que nós no temos a oferecer.
Uma doce melancolia traz a lembrança das sombras das nuvens, percorrendo o vasto céu azul. Somos tiranos!, lembramos-nos e gritamos em uníssono às montanhas. Sussurraria-mos tal verdade escondida às árvores mas elas são testemunhas caídas da nossa maldade. Caem e ardem, uma a uma, sem voz. E nós viajamos para longe. Para nos escondermos do sangue nas nossas mãos, para nos esquecermos de tudo o que fizemos. Quem sabe, talvez o vento nos persiga até ao nosso leito de morte e nos lembre de tudo isto, de tudo o que fomos.
Sentes o poder dentro de ti, a fluir, a dominar? É tudo mentira. A partir do momento em que olhas de cima para baixo nas pessoas, a única coisa que poderás alguma vez encontrar é o teu reflexo no fundo, o hediondo, odiável, repulsivo ser que criaste a partir de um ego que nunca foi merecido. Depois de queimares toda esta terra, de nunca a teres adorado como ela merece, de seguires as tuas próprias vontades sem te preocupares com os outros, achas que podes emendar todos os erros? Errado! Num único ritual espero que te encontres na chama e que vejas tudo à tua volta como deveria ter sido e tudo aquilo que nunca tiveste nem vais ter. Felicidade

Beltane's first words

Tonight I'll dream of faeries and dragons, birds and trees. I hope to find the one I seek beyond the mist...