sábado, 28 de maio de 2011

Através dos bosques

Sinto uma tranquilidade crescente, chegando tardiamente, através da noite, pela melodia. O som das flautas e dos violinos fazem-me ver as árvores que tapam o Sol, numa tarde que anuncia o seu fim num mundo apenas meu. As teclas do piano fazem-me olhar em frente e ver o lago que tranquilo dorme esperando a noite para inundar os meus sonhos com visões do amanhã e memórias do ontem. As mãos passam pelas cordas da guitarra clássica e o som sai tão naturalmente, deixando-me tão confortável, entrando na casa de madeira que construí com a minha mente, à orla da floresta, à beira do lago, aqui está o meu coração, onde ecoa a melodia de tempos em que os meus pés não tinham pisado a terra, oferecida a nós, ainda por fazer merecer tal honra.
A mente deriva e uma pergunta deriva no ar: que é um Homem sem a sua fé, qualquer que seja ela, mesmo não sendo uma crença religiosa, apenas uma filosofia, um objectivo, um caminho? Um homem quebrado. Tal como me sinto agora. Agarrado ao passado, esperando que este se venha a encontrar com o futuro. E um homem quebrado não tem vontade, não tem forças. Por isso derivo conforme o vento sopra acima da água do lago, deixo-me ir porque a corrente é demasiado forte. E espero encontrar uma cascata que me force a parar e retomar o meu caminho ou que me deixe cair para o mais pequeno recanto da floresta e aí meditar, acalmar, durante dias e noites. Talvez depois volte a andar e tentar encontrar o caminho para casa onde a música paira no ar, esperando por mim, debaixo de chuva ou Sol, dia ou noite.
O bosque esconde-me de tudo o resto lá fora. E tudo o resto lá fora é uma parte de mim que deixei para trás. Não deixa saudades. Talvez até deixe mas recuso-me a encara-lo tão facilmente. E deixo as sombras das árvores abaterem-se sobre a minha casa, serenando-me o espírito com canções de segredos e de tempos para vir, profetizados por tantos que apenas em lendas sabem ser verdadeiros. Ao som dessas canções pesam-me as pálpebras e fecho os olhos, durmo um sono profundo que sei ser leal. Sonho dentro de um sonho, com dragões, castelos e cavaleiros, poções mágicas e feitiços. Desenlaces de vidas passadas que sei na minha mente serem minhas e de mais ninguém. E não espero que mais ninguém compreenda o seu verdadeiro significado, apenas por bosques vagueando e nos bosques se perdendo encontramos a alma que julgámos há tanto tempo perdida.

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