terça-feira, 7 de abril de 2009

Sóbria voz que ecoa pelas escadas da glória

Sóbria voz que ecoa pelas escadas da glória, que me chamas nesta noite cheia de essências fantásticas e palavras deixadas para concretizar o vazio. Aqui a tua palavra vale mais do que os meus sentimentos, as minhas visões são obsessões que me preenchem os olhos e que constroem a tristeza. Que vitória tenho eu sobre os meus demónios se nem sozinho consigo dormir sem ser na posição do meu nascimento? E o ciclo recomeça, esta tristeza abate-se sobre mim outra vez, enquanto desejo o teu leito para descansar. E as palavras são escritas, ainda esta voz sóbria ecoa na minha cabeça, relembrando o meu orgulho pela glória de outrora.

"Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso."
Alberto Caeiro - "I - Eu Nunca Guardei Rebanhos" - "Guardador de Rebanhos"

Teme-me. Teme-me pela minha loucura, pelo meu vazio, pelo frio que sou e que te faço mostrar. Teme-me pela minha loucura, afasta-te pela minha carência habitual. Encontra o medo de te magoares e afasta-te de mim. Empurra-me para longe, não te quero magoar. Não desejo retirar-te a inocência que te faz tão linda, nem a tua criança que tanto me faz querer abraçar-te. Já me repudiaste, já expulsei de mim a minha incapacidade de sentir. Faço de mim um boneco a avançar contra mais uma parede, com um sorriso cozido à estupidez da falta de pensamento e uns olhos muito abertos à cegueira que me condena à eterna dor nos momentos de felicidade. Mas no escuro somos iguais, eu - uma pequena criança com medo de existir e sentir - e tu - um amor que confesso não existir uma vez mais.

"Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é uma ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho. "
Alberto Caeiro - "I - Eu Nunca Guardei Rebanhos" - "Guardador de Rebanhos"

É o meu desconhecimento que trata do meu contentamento de estar aqui. Vivo para aprender e luto para chegar a uma loucura mais profunda, um novo nível de degredo, estragando este solo feito pelos que já percorreram esta gruta, contaminando-o com novas palavras que se pensam ser pensadas mas na realidade são despejadas como fardos nas costas. Aqui os relâmpagos são mais fortes, aqui as trovoadas somos nós. Aqui caio ao chão à vontade e levanto-me outra vez sozinho, por vontade própria, por saber que há uma escuridão maior onde os meus amigos me esperam. Percorro estas grutas, afasto-me de ti, exprimo a minha raiva pelo silêncio e destruo almas com as minhas asas libertas. E os meus demónios olham-me com os seus olhos brilhantes, temem-me pela loucura que procuro e escondem-se por não poderem amar-me e odiar-me ao mesmo tempo.

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...
Alberto Caeiro - "II - O Meu Olhar" - "Guardador de Rebanhos"

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