quarta-feira, 13 de maio de 2009

Um brilho nos olhos

Preciso de me exprimir, contar toda a verdade, não esconder nada, porque a minha consciência me pesa, porque a escuridão me atrai, porque o desdenho que vejo nos olhos de desconhecidos me trai. E aí as palavras deixam de fazer sentido, os gestos são banais e as memórias são tudo a que nos pegamos numa noite fria onde não há mais lugar na alma para mais destruição. Desperdício de recursos e forças, seres entregues à sua execução por opção própria, como ratos, pequeno, impotentes, vazios absolutos. No seu egoísmo, são cegos à sua própria condição e lançam pragas à divindade que os criou, pelas dores, pelos seres, pelos caminhos que sozinhos escolheram e neles se perderam. Sem vergonha gritam à noite perjúrio na esperança de haver ajuda ali mas a única ajuda que encontram é aquela que sempre rejeitaram. Então caem, são a multidão que furo, ignoro, desprezo. Até ver a face dela, aí caio num estado estático, onde a destruição deixa de ser a alma mas algo a fugir. A sua angélica face, a sua doce voz, tudo o que ela é, procuro mais isso do que um bocadinho de morte.
Derivo no meu delírio, onde me falta a inteligência e a originalidade, onde sou comum, parte da multidão. Não nota em mim, ignora-me, despreza-me, fura-me o coração com uma estaca e o vazio fica onde o amor outrora foi. Mas há esperança, tanta quanto as estrelas no céu negro, na imensidão do Universo onde ela é nada, mais multidão, excepto a meus olhos. Admito que sou louco, perdido, um apaixonado que não sai do seu estado porque é confortável, porque gosta de aí estar, simplesmente porque gosto de a ver, ainda que ela seja distante e desconhecida. Não preciso de dias, de letras, de pessoas. Preciso da sua visão e da sua voz - não em mim - tão perto de mim que possa realmente tocar-lhe, minha divindade mascarada de dor. Conhece-la, ser-lhe algo mais, oferecer-lhe o meu ser por completa estabilização da minha mente. Egoísta! Como posso ver dor nos seus olhos e ainda querer-la para mim. Mudo de mim para sombra e observo à distância, sem nada fazer, esperando o tempo.
Afundando-se mais no seu buraco negro, estendo uma mão para a apanhar, tento ser a luz que tanto ela repele com os olhos. Se apenas ela visse o brilho nos seus olhos, se ao menos entende-se o significado dos meus. Mas não falo, não me exprimo, não quero ser mais dor. Posso tentar dar-lhe mais, ser-lhe mais mas mais ela se afunda, mais ela foge, mais ela se refugia no seu canto, pequena como ela é, onde não consigo chegar. Ainda estendo a mão, tanto por ela como por mim, esperando o seu toque. Dar-lhe uma flor para quando ela chegar aqui, puxada pela corrente da minha vontade, pintar-me da forma que ela quer para que eu seja alicerce da sua sobrevivência. Tudo para a ter aqui, nem que seja um retrato vivo do egoísmo que trará a completa morte do meu sorriso, nem que mate tudo o que sou. Tudo isto para algum dia dizer-lhe o que significa o brilho nos meus olhos porque eles só brilham quando a vejo e porque a vejo.

2 comentários:

Anónimo disse...

Belo brilho esse que brotam dos olhos de quem ama...

:)

Belo texto tambem :)

abraço

Anónimo disse...

Excelente forma de mostrar os sentimentos. Muito bem escrito.

São palavras com um sentido semelhante ao único texto que tenho no meu blog.

Talvez queiras dar uma vista de olhos para perceberes o que digo...

Abraços (também li mais uns textos...sem dúvida que tens o dom da palavra)

Abraços (http://lookingforyou.blogs.sapo.pt)