domingo, 21 de novembro de 2010

Amargo temporal

Tudo o que desejava era um pouco de silêncio. Um momento para repousar, para deixar a mente descansar. Pela sanidade de simplesmente ser, de querer transmitir palavras pelos olhos, por tudo o que sonhei, conquista inacabada que acabei por desapontar toda a gente. E tentar merecer um momento de reflexão, nesta ingenuidade que não é só minha mas que dela todo sou, nu, cru e congelado. Congelado no calor do medo, no vento da ignorância e no mar da esperança que em tudo é vã e nos mortais um mito.
Então procuro o silêncio nos gestos das pessoas e no céu azul que se abre sobre nós. Então somos vergonha de nos mostrar-mos e fugimos dos olhares, deixamos os cabelos cair sobre os olhos e a sombra abraçar-nos. E tudo somos na noite eterna do ano primordial da nossa loucura, doce refúgio da nossa doença, a indecisão dos afectos partilhados por tantos clones da mesma fábrica. Tudo pela evolução da destruição, a distribuição radioactiva do sono. Embrulho-me nos lençóis com esse mesmo sono e com os pensamentos a desvanecer. Ainda assim procuro o silêncio, o infindável vazio em que me afogo, na desolação e falta de consolo.
Encontro nos braços da angústia a exorbitância da melodia que tanto anseio vendo o solo corrompido pelo betão do homem e o céu a chorar pela perda da pureza. O nosso mundo dividido do deles por muros, as nossas ideias diferentes e corrompidas, as suas ideologias perdidas e o nosso Sol escondido atrás das nuvens. O cinzento reflectido na artificialidade das nossas intenções. Falo por nós, falo por mim, pela minha demanda e pela ninfa que ainda espero conhecer.
O silêncio é relativo aqui. A mente não descansa, ainda no escuro imagina o que não pode ter, nunca censurando, sempre murmurando os gritos em mim contidos. São ruídos, os meus pensamentos, estão apagados quaisquer sentimentos alguma vez pensados em criar. Sou tolo por não querer abandonar este lugar. Sair pela porta, correr, fugir, ser uma vez aquilo que me impedi de ser. Minto-me, refugio-me no sabor dos seios de uma paixão da vida anterior. Mas ela não existe aqui, não existe para mim. E se alguma vez existir, que a mate ao primeiro golpe para a ver chorar e eu me ajoelhar no seu leito de morte e chorar eu próprio, o martírio da minha própria paixão. Ajoelho-me e caio na prisão de pedra do meu coração, este castelo pintado de vermelho para não ser mais deserto que os espíritos que já o habitam. Eles sussurram, inventam uma nova noite na mesma escuridão de sempre. Exteriorizam o que não sou capaz de exprimir, eles sendo falsos, eu, não me entregando completamente ao facto de que sou um fardo à minha própria consciência, numa trágica epopeia, uma procura pelo silêncio que minha tranquilidade não parece inventar.

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