sábado, 23 de março de 2013

Mergulhar

Consegues ver se o céu é estrelado ou nublado, nesta noite em que me despeço novamente de ti, mais vazio agora que não estás comigo? Consegues vê-lo e declará-lo pintado ou construído, talvez até escrito? O certo é que foi criado. Está acima de nós e dentro de nós. Pois se dentro de mim reside declaro que tu és o meu céu pois em mim vives infinitamente. Expandes-te. Nunca páras de te expandir. Por caminhos sinuosos, com a luz escondida atrás de nuvens e trilhos de espinhos, ou por caminhos de terra, abatidos antes da tua passagem para facilitar a leveza do teu caminhar, fazes a tua viagem até a mim. Encontras-me desnudo diante de um precipício, contemplando a hipótese de me atirar.
Estou sentado na beira da rocha, olhando para o infinito e confundindo-o com o vazio, subconscientemente sabendo que és tu. Vejo o horizonte nocturno tão bem como vejo as pequenas ondas que nadam no oceano tão amplo, iluminadas pelo luar que se pousa lentamente. Parece que a Lua vai cair no mar e não se erguer mais, disseste-me uma vez. Fugiríamos para o bosque e lá nos refugiávamos, disse-te eu em resposta. Lembras-te? Deverias. Pois foi na escuridão desse mesmo bosque que te escondeste de mim. E é de lá que emerges outra vez. Desse bosque que deixei para trás, que viro as costas, que nunca voltei a pisar. Será como solo sagrado para nós, terminei o nosso plano de fuga. Mas ignoraste o nós. Importaste-te apenas pelo teu eu. E para a escuridão dessas árvores fugiste. De mim? De nós? Não importa. Tentei agarrar-te e chamar-te à atenção mas não ouviste. Continuaste a correr e deixaste-me. Pois fica lá. Livremente as minhas pernas fora da rocha baloiçam, ao ritmo do vento. Deixaste o tempo passar, deixa o meu corpo na água mergulhar.

Linda Martini - Lição de Voo nº1

Sem comentários: