domingo, 12 de dezembro de 2010

O olhar da felicidade

E como um sonho, abandono esta realidade confortável. Desperto para um mundo hórrido onde existem apenas barreiras e grades que nos impedem de alcançar minas de ouro e fogueiras quentes rodeadas por tendas preenchidas de felicidade. Vejo e compreendo o cinzento que sempre me acompanhou, agora realmente percebo porque sempre cá ficou. Viro então as costas a este mundo na esperança de fugir mas todas as portas me levam aos mesmos mundos. Desisto e caminho para a chama que apela pela minha presença entre os loucos e felizes. Sento-me e observo, isolo-me e relembro-me da minha clara solidão que ainda mais me assola agora. Por entre olhos soltos que se movem na escuridão, raramente lançam um sorriso no meu caminho. Foco-me num par mais atrevido e sorrio sem intenção mas sem engano. Levanto-me e caminho para as dunas do horizonte, lá poderia definir a minha consciência. Confesso que não absorvi a totalidade da situação, não consegui prosseguir o raro desejo de companhia. Acho errado procurar roubar o que já tem dono mas não consigo largar a agradável sensação de falar, de tocar, de simplesmente estar ao pé daquela criatura. Ainda que apenas por um leve momento nos cruzamos, consegui imaginar a minha vida inteira com ela. Adormeço com o brilho dos seus olhos a resplandecerem nos meus sonhos.
Acordo e a noite ainda está instalada. Aqui a noite é eterna para que a felicidade perdure. Errado seria lutar para trazer o dia para que todos se pudessem sentir miseráveis como eu. Vejo um vulto a afastar-se da chama, a lutar para sair da sombra que apaga os rostos e une os corpos. Uma silhueta do corpo que imaginei para toda a minha vida, de carne e osso, lágrimas e sangue, a caminhar na minha direcção, os seus olhos ainda a brilharem o seu sorriso a agarrar-me a arrastar-me para a sua realidade. Não lhe ofereço resistência, ofereço-lhe sim a minha mão para a ajudar a escapar à união das sombras onde não há individualidade. Puxo-a com todas as minhas forças e trago-a para o meu conforto, perto do meu corpo. Vejo toda a sua face e a infinidade da sua beleza e perco-me nela, envolvido de uma neblina que traz consigo a brisa de Verão, afastando-lhe os cabelos da cara e seduzindo-me para os seus lábios e o seu ser. Levanto-a e corro, sendo este o único instinto que possuo neste momento, quero afastar-me daqui e começar uma vida feliz.
Os tempos correm em velocidade, horas transformam-se em minutos, minutos alargados onde nos encontramos sentados a conversar. Com todo o medo fico afastado dela, temendo que ela se assuste e se vá embora. Mas ela mantém-se aqui, até no frio em que dormimos abraçados, as noites mais felizes da minha existência. Amamos e sofremos, vemos os tempos passar e os nossos filhos a crescerem, a vida que eu imaginei há tanto tempo agora tornada realidade. Os seus cabelos grisalhos e a sua cara coberta de rugas enquanto que eu me mantenho na mesma condenada imortalidade. Ela lança um último suspiro de amor quando as brumas voltam para a levar. Choro e sofro, há muito que os meus filhos viajaram para encontrar a sua própria neblina e agora viaja ela para a Terra de Verão onde nunca mais temerá o dia ou a noite, o frio ou o quente. E então grito aos céus: "PODEM FICAR COM A MINHA RIQUEZA E COM A MINHA ALMA, TRAGAM-NA APENAS A MIM PARA EU TER A MINHA FELICIDADE". Mas nenhuma riqueza obtenho e encontro-me com uma nova porta para um novo mundo onde bombas caem e pessoas morrem. Aí entro e sento-me no canto mais perto para não encontrar mais olhos pois nenhum alguma vez se comparará aos dela.

1 comentário:

Blood Tears disse...

A alma partiu no olhar de neblina, para o horizonte brilhante da loucura......

Blood Kisses