quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Epopeia

Aurora

Sancto refúgio a tudo o que sente,
O movimento parece agora distorcido,
Lá no além onde o Mar não se vê,
E o desespero deixa o povo à Sua mercê.

Ao ritmo da queda do desfiladeiro,
O negro aparece na mente,
O medo toma conta do verde,
A ti te guardo, minha desastrosa morte.

Os caninos prendem às correntes,
O Mar lança-me as suas ondas,
Afundando-me cada vez mais no seu denso azul,
Encontro em Ti a minha luz.

Em reles agitação,
O vento traz a mensagem da tua perdição,
Talvez até fosse a tua vez de me desiludires,
Já eu me enganei vezes por demais.

Interludium I

Em pagão ventre, choro a morte da tua face,
A alegria que uma vez me pareceu tão real e forte
Assombra-me agora com ideias de isolação e artificialidade.

No arado da vida, continuamente enganados,
A distracção pelo prazer carnal tirou-nos a verdade dos olhos,
E a alma que tão frequentemente sente, leva-nos o cinzento.

Segmento

Deixemos então a semente da dor enterrada fundo na terra,
Sacrifiquemos as nossas esperanças e entreguemos os nossos sonhos,
Revelando atrás da cortina a morte do artista,
Que neste palco se incendiou e tão facilmente renasceu perante nossos olhos.

A serpente espalha o seu veneno,
Conquistou já o teu tempo,
Regressamos então à altura do conhecimento,
Em que a honra era o homem da guerra que procurava na Natureza o seu último sonho.

Escassez da dor no nome das rosas,
Lança um engano às tuas mãos que se encontram agora feridas,
Na juventude desse teu desespero, dou-te ainda muita vida,
Eu, quem muito tempo te tirou, quem muita paciência entrega por teus erros.

Engole um último engano,
Faz-me esse favor, dá-me esse prazer,
Talvez até o solstício te traga novas do outro mundo,
Que tanto desejas visitar.

Interludium II

Na memória das metáforas,
Corrupto caminho que percorremos até às colinas,
Por entre florestas onde as chamas são espirais ardentes de desconforto.

Nestes defeitos majestosos,
Aproxima-se a realeza ao povo,
Onde a morte consagra o sangue baptizado.

Invisibilidade

Aqui não mandamos mais do que os nossos próprios deveres,
Aqui não somos mais do que nobres e cegos cavaleiros,
Daqui não passa o propósito da devastação e terror,
Manifesto para ti e para tua morte o meu profundo horror.

A tua face, coberta com códigos indecifráveis,
Quebra o silêncio da tua dor anónima,
Usando heterónimos escritos em folhas caídas directamente do Outono,
Queimadas num engano do espectro.

Aos céus e voltando,
Enganando a sua tirania com palavras atiradas ao acaso,
Regressando aos fantoches da nossa beleza,
Deixamos crescer a invisibilidade da nossa divindade.

Às minhas deidades, ainda por descobrir,
As feras que me protegem dos teus pesadelos,
Tochas lhes ofereço, juntamente com o meu juramento,
De honra e orgulho.

Interludium III

Na saudade do erotismo em todo o seu regresso,
Incontrolável desejo de a teu pele sentir,
Neste tom de vida acústico pintado de castanho.

No casamento do nosso amor,
A ligação estabelece uma troca de prazer e dor,
Uma mistura apenas sentada aos pés dos fins do Inverno.

Aniversário

O meu sorriso perante o teu esplendor,
O meu riso perante tuas palavras preenchidas com saudades,
A minha cegueira te ofereça uma linha por onde seguires,
Um labirinto que atravessei para me encontrares.

Atravessando o mar que nos separa,
As brumas não me perseguem mais,
As ondas oferecem força para continuar,
As terras dão boas vindas ao nosso romance.

Quantos tempos mais teremos nós de esperar por uma Lua Cheia,
Nós seremos abençoados pela razão rara da luxuria,
Decidindo que teremos de viver para num novo dia renascermos,
E celebrarmos mais um aniversário do nosso ser.

Entrelaçando as estrelas com a noite,
Combinando a tirania do vasto céu azul com a sua palidez,
Encontramos os mesmo fantasmas das nossas vidas posteriores,
Quando nem podíamos ser donos dos nosso corações.

Interludium IV - Final

Um intervalo para relembrar o nosso passado,
Oferecemos aos nossos erros a promessa de não os voltar a cometer,
Entregamos-nos ao nosso eterno abraço, amaldiçoado.

Arrastamos os ventos por entre os Mares,
Controlamos o que à nossa frente mas sempre submissos,
Submetidos às ordens Dela.

Morte
É um terrível fascínio, aquele que partilho contigo,
Aquele que me foi imposto por outrem antes de conhecer.
É um terrível destino, conhecer-te e não partilhar-te,
Conceber este fascínio que por ti também tenho e não poder ter-te.

Engulo a cobra e transformo-me no seu veneno,
A sabedoria que me percorre as veias,
Escalando a minha própria transparência até ao cérebro,
Controlando, modificando, melhorando.

Sair deste buraco, pensando fora da caixa,
A honra dá direito à desordem que corre por mim,
O orgulho é a morte do guerreiro, quem tantas promessas fez,
Quem agora jaz neste solo pútrido pela falta de chuva.

Lança-me então o teu último suspiro, já to pedi tantas vezes,
Dá-me o sabor das tuas lágrimas,
O preço não é demais saber,
É demais ter e não saber usar, desperdiçado pela opressão criada pela tua própria mente.

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