domingo, 30 de novembro de 2008

Introdução

Sinto-me rodeado por ignorantes. Tanta vez encontro paredes, mentalidades diferentes, ideias diferentes, filosofias que não correspondem. E julgo-me frio, logo raciocínio com mais lógica que os outros não frios. Mas não há o relevo de uma mentalidade inferior. Nem de uma superior. Mas há algo mais aqui. Há algo de facto. Há um frio ao meu lado que me cola os lábios e não permite que os pensamentos saiam. Um frio que vem por esta altura do ano ou que me acompanha pela espinha e lá se aloja até chegar ao Verão e ao coração. Já o calor ficou na cama. Na sua inocência imaterial, mostra-me o bom que é estar lá. E aí estou sozinho. Sozinho e no silêncio do meu quarto. O silêncio não é obrigatório - é inconsciente. Natura e automaticamente realço a beleza da escuridão que abraça a minha cama, aquecendo-me por longas noites sem chuva. E são os candeeiros que dão luz lá fora, na sua solidão presa por fios. Eles, na sua bela incapacidade de sentir ou pensar, estabelecem uma ligação ao vício de enregelar. O seu aço funde-se com a humidade seca e juntos fazem brilhar o cinzento pelas sombras que criam com as palmeiras à sua frente.
Começo a notar que a idade já não tem perdão de mim. Deixa-me pegado a memórias e cicatrizes e traz a transparência para os bastidores do ser. A minha ignorância e insegurança consumem os focos da peça de teatro que é a minha vida. E o público é um exaustivo turbilhão de filosofias e julgamentos sem qualquer razão de ser. Apenas por um impuro olhar, um relance de mau humor causado pelo frio. E está tanto frio cá dentro. Tão frio... distante, isolado. Não se consegue encontrar luz pois a luz provém dos candeeiros e, ao contrário desses, eu sinto e penso. Penso... e se penso. Se há coisa que não páro de fazer é pensar. Pensar, observar e julgar no silêncio que pergunta as questões de ser. E sinto. Sinto ódio, raiva, compaixão, um misto de todas as coisas humanas que restam em mim. É confuso. Não quero sentir... não quero apaixonar-me e andar por aí agarrado a alguém e a algo. Quero-me sentar em cima da cama e escrever até a minha mão desparecer e a minha imaginação desaparecer. Aí saberei que os sentimentos esvaneceram. Finalmente, uma razão real para escrever. Escrever loucuro e espinhos que magoam, fazem chorar e sangrar.
Não somos escritores. Pessoa, Verde, Camões... somos apenas tresloucados que andamos a ver e a pensar demasiado em vez de andarmos por aí nas ruelas a beber e a cantar, viver a vida e a destruirmo-nos por dentro. Devíamos ter deixado as nossas vidas de sentimentos, pensamentos, filosofias para trás. Tudo isto é em vão. Qualquer um pode pegar numa caneta e escrever. Até um míudo de 4 ou 5 anos pode escrever sobre o quão feliz é na sua ignorância. Não somos nada, nunca o fomos. Simulamos todas estas coisas para dizer que não somos os mais inúteis e tristes à face da terra. E de facto não somos. Os mais tristes são os que se sentam nas cadeiras a lamuriar-se. Ao menos nós ainda nos escondemos atrás de mil máscaras e mentiras e até mentimos a nós mesmos sobre essa mesma tristeza que sentimos dentro de nós. Não é afastar ou esconder, ou até mesmo apagar, é mentir. Sempre foi. E se o gritarmos conscientemente, talvez venha um trovão das nuvens e nos reduza a cinzas para alimentar a terra. Mas vocês já foram, esqueço-me. Resto eu. Eu e muitos outros que ousam pegar na caneta. Somos todos incapazes... meros idiotas.

2 comentários:

My little Moon disse...

Lindo... lindo!

Lunatic disse...

"O silêncio não é obrigatório - é inconsciente."

Viciei-me nesta frase e prendi-me à mesma até ao final do texto.
Gosto da maneira como consegues exprimir o que sentes acerca do mundo que gira à tua volta.