Há uma gota nos olhos que não quer cair, um sentimento que resiste em ser demonstrado, um amor que desaparece e reaparece a seu gosto, sem qualquer justificação, sem qualquer piedade da sanidade do homem que se senta naquela pedra à beira do lago. Movido pelo negativismo, fonte do seu poder, ele relaxa, olhando para lado nenhum, apenas apreciando o som da água a cair, uma cascata que promete um abraço curto e vil, o tipo de abraço que o homem sempre ofereceu a outros. A demonstração da perdição deste homem foi outrora espectáculo, agora é apenas mais um objecto usado que se deita fora, deixa-se perder na floresta e cai na tentação da morte. Os seus olhos, agora mortos, não demonstram mais nenhum brilho e a criança interior ficou retida na jaula, não chorando, não mais sofrendo.
"Uma vez no interior, nunca mais se liberta." As palavras são assim repetidas pelo poeta que nunca se veio a demonstrar à sociedade, perdendo-se no seu ciclo, deixando os outros usarem-no, manipularem-no. Homem sem vontade, sem objectivo de vida, deixou-se cair no vazio que ocupa agora o lugar da alma. Alma essa, que entregou às palavras escritas no papel com sangue das suas veias e carne do seu corpo. Retido na sua casa escura, alimenta-se do ar que já circulou pela alma vez sem conta. Ele sente que a sua vida lhe escapa pelas mãos e agradece à Mãe a oportunidade de morrer para que a sua alma possa renascer noutro lado, divulgando assim as suas palavras à sua livre vontade e liberdade, demonstrando assim o seu poder a toda a gente.
Sinto que é a manhã a florescer, este sou eu. Vejo que o vento morreu mas deixou cá a chuva que tanto gosto. Pelo menos as nuvens cinzentas cá ficaram e não dão sinais de partir. O Sol brilha timidamente, convidando-me para uma vista para o exterior. Cresce o ódio no interior, transformando-se em energia para o movimento, energia para a luta. Adormeço para a nova dança hipnótica à volta da fogueira, onde a morte se transforma em mais um de nós e juntos consagramos mais uma possessão de alma, vitória sobre os perdidos e os ignorantes. Condenação daqueles que por aqui passaram e que nunca mais cá regressaram. Uma profecia foi deixada para trás, uma palavra que voou pelo vento, caída da boca dela para as minhas mãos. Ardentes lágrimas de deuses que se transformam em palavras outrora usadas que agora voltam para me assombrar.
Doce abraço, amargo beijo, a tua face escaldada e transformada num desenho retorcido, fugindo cada vez mais à realidade, deixando para trás uma lágrima como promessa de um futuro retorno. Um reflexo que fugiu, um romance que se escapou por vontade de outrem, era o mundo contra nós e eu poderia jurar de joelhos que nós ganharíamos. Mas nem sempre fomos nós contra eles, às vezes parecia ser eu contra tu e eles. As palavras não deixavam percorrer o espaço deixado na obscuridade entre nós. E na escuridão nos guiamos, de encontro um ao outro. Mas a chuva não promete arder uma vez mais, porque regressaria o romance a nós?
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