- Posso falar contigo?
Gesticulei para que passássemos as finas mas altas janelas para o jardim. O tempo era frio, vento forte, nuvens negras, ia começar a chover a qualquer segundo. Mas isso não importava na altura:- Deixa-me perguntar-te algo. Mesmo sabendo que ele nos poderia ver lá, porque é que arriscaste a ir comigo?
- Oh, não podia cancelar depois de já ter aceite o convite.
- Podias. Inventavas alguma coisa, adiavas até conseguires saber um dia em que ele não lá estivesse e marcavas para esse dia.
- Não me lembrei disso. Mas não houve mal. Porque perguntas isso?
- Foi a única coisa que não consegui arranjar uma explicação em que acreditasse.
Fitámos-nos durante uns tempos, os seus olhos azuis-safira com uma docilidade enganadora. Ela acabou por sorrir.- Está bem, era tudo o que precisava de saber.
- Se era só isso, porque pareces tão zangado? Estavas à espera de outra resposta?
- Não, só queria perceber porquê. Mas desiludes-me. Sempre te vi como o tipo de rapariga forte, que não sentia a necessidade de responder a alguém. No entanto andaste todos os segundos comigo cheia de medo de que ele nos encontrasse, sem que nós estivéssemos a fazer nada de mal nem vocês estando numa relação.Parecia chocada e zangada, pronta a bater-me ou ainda pior, virar-me costas e nunca mais me falar.
- O que eu faço, digo ou penso não te diz respeito. Nem sequer me conheces.
- Verdade.
- Mas então responde-me tu a isto, porque quiseste tu sair comigo?
- Porque vi qualidades em ti que gostei.
- É? Tais como?
- És independente, és inteligente, bonita, determinada e reservada. Muitas vezes mentes para que não tenhas de revelar o que sentes mesmo mas acredito que consigas ser directa e honesta quando chegas a um limite ou quando a pessoa não te diz nada. Ultimamente tenho vindo a descobrir mais mas não interessa...
Ficou quieta, calada, os lábios semi-abertos, a olhar para mim ainda à procura de uma resposta à altura.- Não te vou dizer como viver. Não é a minha responsabilidade. As opções que tu tomas são tuas e apenas tu terás de sofrer as consequências das tuas acções.
A este ponto ela estava à beira de chorar.- Porque é que me estás a tentar magoar?
- Não te estou a tentar magoar, estou apenas a ser honesto contigo. Não te vou forçar a abrir e a amar. Sei que te fechaste e que mentes para não te magoares, todas pessoas do sexo masculino que entraram na tua vida abandonaram-te e isso ainda te magoa. Mas é disso que a vida é feita. De mágoa. A capacidade de respondermos à dor, levantarmos-nos do chão e continuarmos a viver a vida abertos e disponíveis é que mostra a nossa qualidade como pessoas. É isso que marca a nossa humanidade. E por mais que tentes, por mais tempo que passe, vais eventualmente sentir a vontade de arriscar algo com alguém. Suponho que só estivesse com a esperança que esse alguém fosse eu.
Disse-lhe estas últimas palavras, virei-lhe as costas e iniciei o meu caminho de volta a casa. Agora não sei o que vai acontecer, suponho que apenas o tempo vá dizer.
3 comentários:
Há coisas, que têm realmente que ser ditas. O futuro? O tempo o dirá.
Continuas a escrever maravilhosamente.... ^^
Blood Kisses
Obrigado São! Este texto por acaso é uma espécie de previsão de uma discussão que vou ter esta sexta ;)
Então já que hoje é a tal sexta.... Boa sorte! ;)
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