quinta-feira, 19 de maio de 2011

Ao sabor do vento, debaixo de nuvens cinzentas

O corredor era longo e estreito, apenas no final estava o objectivo da minha vinda. O vento soprava para dentro do pavilhão através das poucas janelas abertas e fazia com que o seu longo cabelo louro levantasse voo levemente, enquanto ela falava sorridente com as suas amigas. Esperavam pela hora para entrar na aula, falando alegremente. Ela continuava sem olhar para mim, aproximei-me rapidamente dela, agarrei-lhe no braço e perguntei-lhe:
- Posso falar contigo?
Gesticulei para que passássemos as finas mas altas janelas para o jardim. O tempo era frio, vento forte, nuvens negras, ia começar a chover a qualquer segundo. Mas isso não importava na altura:
- Deixa-me perguntar-te algo. Mesmo sabendo que ele nos poderia ver lá, porque é que arriscaste a ir comigo?
- Oh, não podia cancelar depois de já ter aceite o convite.
- Podias. Inventavas alguma coisa, adiavas até conseguires saber um dia em que ele não lá estivesse e marcavas para esse dia.
- Não me lembrei disso. Mas não houve mal. Porque perguntas isso?
- Foi a única coisa que não consegui arranjar uma explicação em que acreditasse.
Fitámos-nos durante uns tempos, os seus olhos azuis-safira com uma docilidade enganadora. Ela acabou por sorrir.
- Está bem, era tudo o que precisava de saber.
- Se era só isso, porque pareces tão zangado? Estavas à espera de outra resposta?
- Não, só queria perceber porquê. Mas desiludes-me. Sempre te vi como o tipo de rapariga forte, que não sentia a necessidade de responder a alguém. No entanto andaste todos os segundos comigo cheia de medo de que ele nos encontrasse, sem que nós estivéssemos a fazer nada de mal nem vocês estando numa relação.
Parecia chocada e zangada, pronta a bater-me ou ainda pior, virar-me costas e nunca mais me falar.
- O que eu faço, digo ou penso não te diz respeito. Nem sequer me conheces.
- Verdade.
- Mas então responde-me tu a isto, porque quiseste tu sair comigo?
- Porque vi qualidades em ti que gostei.
- É? Tais como?
- És independente, és inteligente, bonita, determinada e reservada. Muitas vezes mentes para que não tenhas de revelar o que sentes mesmo mas acredito que consigas ser directa e honesta quando chegas a um limite ou quando a pessoa não te diz nada. Ultimamente tenho vindo a descobrir mais mas não interessa...
Ficou quieta, calada, os lábios semi-abertos, a olhar para mim ainda à procura de uma resposta à altura.
- Não te vou dizer como viver. Não é a minha responsabilidade. As opções que tu tomas são tuas e apenas tu terás de sofrer as consequências das tuas acções.
A este ponto ela estava à beira de chorar.
- Porque é que me estás a tentar magoar?
- Não te estou a tentar magoar, estou apenas a ser honesto contigo. Não te vou forçar a abrir e a amar. Sei que te fechaste e que mentes para não te magoares, todas pessoas do sexo masculino que entraram na tua vida abandonaram-te e isso ainda te magoa. Mas é disso que a vida é feita. De mágoa. A capacidade de respondermos à dor, levantarmos-nos do chão e continuarmos a viver a vida abertos e disponíveis é que mostra a nossa qualidade como pessoas. É isso que marca a nossa humanidade. E por mais que tentes, por mais tempo que passe, vais eventualmente sentir a vontade de arriscar algo com alguém. Suponho que só estivesse com a esperança que esse alguém fosse eu.
Disse-lhe estas últimas palavras, virei-lhe as costas e iniciei o meu caminho de volta a casa. Agora não sei o que vai acontecer, suponho que apenas o tempo vá dizer.

3 comentários:

Blood Tears disse...

Há coisas, que têm realmente que ser ditas. O futuro? O tempo o dirá.

Continuas a escrever maravilhosamente.... ^^

Blood Kisses

Bruno Carvalho disse...

Obrigado São! Este texto por acaso é uma espécie de previsão de uma discussão que vou ter esta sexta ;)

Blood Tears disse...

Então já que hoje é a tal sexta.... Boa sorte! ;)